Desmatamento e queimada próxima à Floresta Nacional Bom Futuro, em Porto Velho, Rondônia, em outubro de 2023. (© Marizilda Cruppe / Greenpeace) |
Redação Voz da Terra
Porto Velho, a capital rondoniense, desbancou os tradicionais polos agrícolas do sul do estado e assumiu a liderança na produção de soja em 2023. A expansão do grão na região, impulsionada por altas cotações no mercado internacional, desenhou um novo mapa agrícola para Rondônia. Mas essa prosperidade econômica tem um custo ambiental altíssimo.
Segundo dados da Pesquisa Agrícola Municipal (PAM) do IBGE, a produção de soja em Porto Velho saltou de 112 mil toneladas em 2022 para 181 mil toneladas no ano passado, um aumento de 62,3%. O avanço da fronteira agrícola, no entanto, coincide com um preocupante aumento do desmatamento e das queimadas na região amazônica.
A área de fogo florestal também cresceu: Rondônia registrou 7.282 focos de incêndios entre janeiro e 5 de setembro deste ano, de acordo com o "Programa Queimadas", do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Essa quantidade é a maior dos últimos 14 anos.
A conversão de florestas em áreas agrícolas para o cultivo da soja é a principal causa do desmatamento no estado. A derrubada da floresta nativa para dar lugar a monoculturas intensivas leva à perda de biodiversidade, à degradação do solo e à intensificação das mudanças climáticas.
O uso de agrotóxicos também cresceu, de acordo com dados do governo. Em 2022, foram liberados mais de 600 novos agro defensivos, o maior número em 23 anos. É um dos estados brasileiros que mais consome agrotóxicos. O uso indiscriminado desses produtos pode causar prejuízos à saúde, ao meio ambiente e à alimentação saudável.
Toda Rondônia assiste com normalidade a destruição ambiental, morte de animais, rios e o cenário de filmes de terror com tanta fumaça cobrindo as cidades. A ausência e a incapacidade do poder público para minimizar os impactos pode resultar na morte de muita gente.
O custo ambiental
Um estudo recente do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAmazon) revela que a produção de soja em Rondônia está diretamente ligada ao aumento das emissões de gases do efeito estufa e à perda de carbono armazenado nas florestas. A pesquisa aponta que a expansão da agricultura mecanizada e o uso de fertilizantes sintéticos contribuem para a degradação dos solos e a contaminação dos recursos hídricos.
A expansão da soja também tem impulsionado a invasão de terras indígenas e de unidades de conservação. A grilagem de terras, a violência no campo e os conflitos por recursos naturais são cada vez mais frequentes em Rondônia.
As novas hectares de soja impactaram culturas tradicionais como o arroz e a mandioca, que perderam espaço. A área plantada com arroz diminuiu 10,6% entre 2022 e 2023, e a produção caiu 6,7%. A mandioca, base da alimentação de muitas famílias rondonienses, também sofreu uma redução significativa na área plantada e na produção nos últimos anos.
Produção de soja é destruidora para natureza (Divulgação) |
Mercado da soja
Em todo o Estado, foram produzidas dois milhões de toneladas do produto no ano de 2023.
No ranking estadual de produção de soja em 2023, após Porto Velho, estão Pimenteiras do Oeste (180 mil toneladas), Vilhena (164 mil toneladas), Corumbiara (160 mil toneladas) e Candeias do Jamari (157 mil toneladas). Juntos, os cinco maiores produtores foram responsáveis por 39,6% da produção estadual.
Também foi mostrado pela Pesquisa que Guajará-Mirim teve produção de soja pela primeira vez em 2023. No município, foram produzidas 15 mil toneladas do produto. Apesar da expansão da soja em Rondônia ano a ano, os municípios de Cacaulândia, Governador Jorge Teixeira, Ministro Andreazza, Monte Negro, Presidente Médici, Teixeirópolis, Urupá e Vale do Paraíso não registraram produção de soja em 2023.
A PAM também demonstrou que Rondônia tem produtividade de soja maior que a média brasileira. Enquanto em todo o Brasil a média foi de 3,4 mil quilogramas por hectare, no estado, foram produzidas, em média, 3,6 mil quilogramas por hectare.
Em relação à área plantada em Rondônia, a PAM aponta que, entre 2022 e 2023, houve um aumento de 20,5%, passando de 489 mil hectares para 589 mil hectares. Em Porto Velho, o aumento de área destinada à soja foi de 68,3%, indo de 31 mil hectares para 52 mil hectares. Chama a atenção, ainda, que Candeias do Jamari quase dobrou o tamanho de área plantada em um ano: 23 mil hectares em 2022 e 45 mil hectares em 2023.
Outras lavouras
A PAM também traz informações sobre produção de arroz. Nos dados da Pesquisa, observa-se uma redução na área plantada no Estado em 10,6% entre 2022 e 2023, passando de 40 mil hectares para quase 36 mil hectares. A produção de arroz diminuiu 6,7%, tendo sido 121 mil toneladas em 2022 e 113 mil em 2023.
Sobre o plantio de mandioca, nota-se uma redução ano a ano. Entre 2018 e 2023, a área plantada em Rondônia diminuiu 27,6% (passando de 24 mil hectares para 17 mil) e a produção em 35,8%, diminuindo de 583 mil toneladas para 374 mil.
Que futuro é esse?
O cultivo de campos de soja em Rondônia coloca em xeque a sustentabilidade ambiental e social da região. É urgente a adoção de políticas públicas que promovam a agricultura familiar, a agroecologia e a produção sustentável de alimentos. Além disso, é necessário fortalecer a fiscalização ambiental e combater a grilagem de terras.
A produção de soja pode ser conciliada com a conservação ambiental, mas é preciso mudar o modelo de produção atual. A adoção de práticas agrícolas mais sustentáveis, como o plantio direto, a rotação de culturas e o uso de agroflorestas, pode contribuir para a redução dos impactos ambientais da agricultura e garantir a segurança alimentar da população.