Centro urbano de Porto Velho - RO - (Foto: Leandro Morais/ Secom - PVH) |
Francisco Costa - Voz da Terra
A realização da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-30) em novembro de 2025 em Belém do Pará, na Amazônia, suscita o debate sobre o que nossas cidades brasileiras estão fazendo para mitigar e adaptar os fenômenos extremos da natureza. Em 5.565 mil municípios, prefeitos e vereadores tomaram posse no início deste mês e todos devem ter o compromisso de pensar como melhorar os efeitos climáticos na vida da população.
Na cidade de Porto Velho (RO), Léo Moraes (Podemos) e a vice Magna dos Anjos (Podemos) (eleitos com 135.118 votos, 56,18%) falaram pouco de impactos ambientais na campanha eleitoral como cheias, secas, desmatamento e os efeitos do agronegócio no meio ambiente.
Porém, no programa de governo deles existem propostas tipo: coleta seletiva de lixo, parceria com cooperativas de catadores e uso de novas tecnologias; geração de energia a partir de biomassa, consciência ambiental nas escolas; preservação de parques ambientais e expansão das áreas preservadas; criação de hortas comunitárias e uso de material orgânico como adubo nesses locais; promoção da economia circular. Léo prometeu também acabar com os alagamentos urbanos, uma iniciativa que vai além de apenas desobstruir bueiros e córregos.
Importante lembrar que a capital rondoniense há anos sofre degradação ambiental: minério de ouro e cassiterita, avanço da soja, pecuária, grandes empreendimentos hidrelétricos, que afetam o modo de vida natural e humano, conflitos agrários, além das pressões que impactam as populações tradicionais da floresta.
Problemas socioambientais expostos
O VOZ DA TERRA ouviu a opinião de ambientalistas, ativistas e integrantes da comunidade científica para saber quais propostas podem ser implementadas pelo novo prefeito.
O biólogo Paulo Bonavigo faz parte de uma organização não governamental que desenvolve projetos de conservação ambiental e sustentabilidade há 37 anos no estado. Ele diz que é preciso a sociedade olhar para os problemas dos ecossistemas que estão sendo cada vez mais frequentes e longos, mudando os hábitos do cidadão. Ele pontua que o período eleitoral deveria ter sido o momento de promover esses debates.
"Uma coisa que preocupa quem trabalha nessa área é que a questão socioambiental, principalmente de mudanças climáticas, ela não estava no discurso de nenhum dos candidatos a prefeito, tanto de Porto Velho quanto dos municípios do interior. O que acontece? A gente tem problemas sérios causados pelas mudanças climáticas já sentidos aqui no estado de Rondônia: seca extrema, rios secando, falta de abastecimento em alguns municípios; a gente já teve e vai ter novamente alagamentos gigantescos em outros municípios, em propriedades rurais e os prefeitos parece que ignoram isso, talvez porque eles acreditam que seja uma pauta da esquerda ou ideológica e quando na verdade não é", diz.
Paulo alerta os novos prefeitos para a importância de implantar políticas públicas para o clima. "A gente sabe que eventos extremos vão prejudicar principalmente a produção de alimentos no estado todo e isso vai gerar problemas diretos na economia, então não é uma pauta ideológica, não é uma pauta de um grupo que a gente está sentindo. A ciência já mostra isso e a gente precisa de prefeitos que trabalhem tanto as mitigações das mudanças climáticas, mas também as adaptações dos municípios para as mudanças climáticas".
Outra preocupação do biólogo é com inúmeras comunidades ribeirinhas, distritos e áreas de proteção. "O que se pensou por exemplo, em Porto Velho sobre a questão da seca no baixo Madeira ou então problemas de seca nos distritos de Porto Velho, deixando pessoas sem abastecimento? Os igarapés urbanos, o que se pensou, por exemplo, nas Áreas de Preservação Permanente urbanas, onde tem problemas, principalmente para defesa civil, onde tem pessoas em situação vulnerável ali, que um alagamento mais severo pode, enfim, até matar pessoas?".
Segundo Paulo existem propostas que podem melhorar a qualidade de vida dos moradores da cidade diante dos problemas climáticos. Ele fala de localidades mais verdes, preocupações com uso do solo e medidas para assegurar abastecimento de água. "A gente não viu isso, arborização urbana, em um ambiente de tanto calor que a gente vive. E a infiltração das chuvas nos solos, a gente vê as calçadas sendo construídas como antigamente, espaços sendo cimentados como antigamente, muito asfalto, mas pouco se pensou na absorção dessa água que vem das chuvas. Tem abastecimento de lençol freático e quem tem poço, e os próprios rios, vão sofrer. Temos compactação do solo, alagamentos muito rápidos e seca muito rápido também. A gente viu isso ano passado, viu isso esse ano. Rios que transbordaram e no dia seguinte estava tudo muito seco, então a água nem infiltra no solo, não vai para o lençol freático".
Legislação ambiental
Neidinha Suruí é historiadora e uma das fundadoras da Associação Kanindé, que defende mais de 50 etnias indígenas. Ela desenvolve projetos no território indígena Uru-Eu-Wau-Wau, um dos mais impactos. Suruí é uma das ativistas mais ameaçadas do país. Para o VOZ DA TERRA ela disse que o prefeito de Porto Velho precisa publicar legislações de proteção da natureza.
"Esperamos que o prefeito Léo Moraes implemente a lei de mudanças climáticas, que está lá há muito tempo, sem que se toque. E que ele também implemente as unidades de conservação e as três Terras Indígenas que tem neste município, que a prefeitura nunca olha, nunca dá atenção. Então, o clima é importante, essa é uma cidade que está sofrendo as mudanças climáticas, e aí eu espero que haja essa preocupação, e principalmente saneamento básico, isso é super importante", disse. Além de publicar legislações é preciso investimentos na fiscalização e monitoramento para diminuir as agressões.
Participação popular
O ativista Iremar Ferreira, faz parte do Comitê de Defesa da Vida Amazônica e desenvolve ações com populações da floresta e indígenas. Na cidade de Guajará-Mirim ele foi um dos articuladores da lei municipal promulgada que garante direitos para o rio Laje, dentro da TI Laje.
"Nosso desafio será criar espaços para além do Conselho da Cidade. O desafio maior é que ele (prefeito) está cercado por ruralistas, os que mais desmatam", diz.
Ferreira defende que é preciso ouvir o povo das comunidades tradicionais na elaboração de programas socioambientais. "Desejamos que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente tenha alguém à frente que tenha compromisso com esse tema e que incorpore as mudanças climáticas não só como nomenclatura. Mas que faça com participação popular a construção de um plano municipal que nos leve a pensar adaptações, recuperação de ambientes diante do cenário das emergências climáticas que tendem a ser constantes".
"Ninguém está falando sobre os cuidados que devemos ter a partir de agora com as mudanças climáticas. Quais medidas de adaptação dessas mudanças e mitigação dessas mudanças a gente vai fazer?", questiona o biólogo Paulo Bonavigo.