Deputados de Rondônia usam CPI para avançar agronegócio e ameaçar florestas protegidas

Parlamentares alinhados com a direita e negacionistas ambientais procuram indícios de irregularidades nas Unidades de Conservação.
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Voz da Terra
23 abril 2025
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Ampliação das áreas de soja ameaça o meio ambiente (Foto: Secom Ro)


Redação Voz da Terra - A Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia (ALE-RO) concluiu os trabalhos da CPI das Reservas, criada para investigar supostas irregularidades na criação de 11 unidades de conservação (UCs) estaduais, formalizadas em 2018. A comissão também se debruçou sobre contratos de crédito de carbono firmados posteriormente com empresas privadas. 

O relatório final da comissão elaborado pelos deputados, expôs contradições técnicas, omissões legais e tensões fundiárias com impactos sociais e ambientais diretos.

Mas além do documento técnico, há um pano de fundo político: a CPI foi conduzida por parlamentares ligados à bancada ruralista, defensores do agronegócio e críticos históricos da política ambiental em Rondônia.

O VOZ DA TERRA analisa os principais pontos do relatório final, os riscos para a política ambiental do estado e os conflitos entre conservação, regularização fundiária e interesses econômicos.

Quem são os deputados da CPI?

A Comissão Parlamentar de Inquérito foi instaurada em abril de 2023 por iniciativa do deputado Alex Redano (Republicanos), que é o atual presidente do poder legislativo. 

Também integraram a CPI:

Pedro Fernandes (PRD) – relator

Jean Oliveira (MDB) – vice-presidente

Cirone Deiró (União Brasil) – membro

Delegado Lucas Torres (PP) – membro

Taíssa Sousa (Podemos) – membro

Todos os parlamentares possuem alinhamento com pautas conservadoras e setores do agronegócio. 

Nenhum deles é reconhecido como defensor ativo da pauta ambiental ou dos direitos dos povos da floresta.

Deputados alinhados à direita e negacionistas ambientais (Foto: Ale RO)

As unidades de conservação sob investigação

As 11 áreas criadas pelo governo estadual em 2018 abrangem cerca de 600 mil hectares, o equivalente a quase quatro vezes o território da cidade de São Paulo. 

As unidades questionadas são:

Estação Ecológica Soldado da Borracha

Estação Ecológica Umirizal

Floresta Estadual do Rio Pardo

Área de Proteção Ambiental do Rio Pardo

Parque Estadual Abaitará

Parque Estadual Ilha das Flores

Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Serra Grande

RDS Rio Machado

RDS Limoeiro

RDS Bom Jardim

Reserva de Fauna Pau D’Óleo

Essas áreas foram criadas no apagar das luzes do governo Confúcio Moura (MDB), como estratégia de compensação ambiental frente aos altos índices de desmatamento em Rondônia.

Aspectos indicados no relatório da CPI

Fiscalização do uso indevido de nomes de técnicos ambientais: o relatório aponta que diversos estudos técnicos usados para embasar a criação das UCs foram fraudados, com assinaturas de profissionais que não participaram efetivamente das pesquisas.

Apontamento de falhas na consulta pública: a CPI revela que em algumas áreas as populações não foram ouvidas, descumprindo as exigências da Lei nº 9.985/2000 (SNUC).

Investigação sobre contratos de carbono: a CPI levantou indícios de conflito de interesse e falta de transparência nos contratos firmados com as empresas Permian Brasil e Biofílica, que pretendiam explorar créditos de carbono em áreas protegidas, com expectativa de lucros bilionários por 30 anos.

Ribeirinhos enfrentam tragédias ambientais (Foto: Secom PVH RO)

Aspectos negativos e vícios da CPI

Viés político e seletividade: a CPI tem nítida motivação política ao focar apenas na legalidade da criação das unidades e não em quem está invadindo ou desmatando áreas protegidas hoje. Não houve investigação contra grileiros, madeireiras ou desmatadores ilegais, o que compromete a imparcialidade do processo.

Ameaça de retrocesso ambiental: ao deslegitimar as UCs, o relatório abre caminho para a revogação ou redução das áreas de floresta protegida, o que contraria políticas globais de combate às mudanças climáticas.

Violação da Lei do SNUC (Lei 9.985/2000): o relatório questiona os estudos técnicos e a ausência de assinatura dos decretos de criação, mas ignora o mérito ambiental e a função ecológica das áreas protegidas, ferindo o princípio da precaução previsto na legislação ambiental.

Fragilidade nos critérios de aferição técnica: os parlamentares trataram a ausência de assinatura física como prova absoluta de nulidade dos decretos, sem considerar elementos administrativos e circunstanciais válidos no direito público.

Queimadas causam danos na saúde e natureza (Foto: Agência Brasil)

O que dizem os dados ambientais?

Rondônia enfrenta uma escalada na degradação ambiental. Em 2024, o estado registrou 7.282 focos de incêndio, o maior número em 14 anos — um aumento de 169% em relação a 2023. Porto Velho concentrou 32% desses focos.

Além disso, um estudo do INPE e da InfoAmazônia revelou que a degradação florestal emitiu mais gases de efeito estufa do que o desmatamento: 161 milhões de toneladas de CO₂ equivalente apenas em 2024.

Paralelamente, a Assembleia Legislativa de Rondônia já aprovou leis que reduzem áreas protegidas. Em 2021, mais de 200 mil hectares de florestas públicas foram ameaçadas em razão da pressão política da bancada ruralista.

Apesar de trazer à tona problemas reais na formalização das UCs, a CPI das Reservas se mostra um instrumento político para desmontar a política ambiental do estado, e não para aprimorá-la. 

Os indícios de fraudes e falhas documentais devem ser apurados, sim — mas com o compromisso com a legalidade ambiental, e não com a pressão por flexibilização fundiária, expansão do desmatamento e colocando em risco populações tradicionais.

Em um momento em que o mundo investe na proteção florestal, mitigação climática e valorização dos ativos ambientais, Rondônia caminha na contramão. 

A pressão por derrubar as unidades de conservação — criadas para conter o avanço predatório — atende interesses econômicos imediatos, mas ameaça a biodiversidade, a segurança jurídica, os compromissos internacionais do Brasil e os modos de vida tradicionais.



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1Comentários

  1. A materia esqueceu de colocar que alguns desses politicos que conduziram a CPI são investigado por grilagem de terra. E outro dado, nenhum é tecnico ou atua na área ambiental. Não apresentaram em quais embasamento técnicos tomaram as decisões, nem qual foi a equipe técnica que analisou, quais os critérios usados, e se algum politico que faz parte da CPI tem interesse nas áreas. Enfim! a quem interessa destruir o meio ambiente.

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