Reginaldo Trindade critica falta de proteção dos povos indígenas (Divulgação) |
O procurador Reginaldo Pereira Trindade do Ministério Público Federal de Rondônia, participou na última sexta-feira (15), de uma coletiva de imprensa em Porto Velho (RO), para apresentar detalhes da investigação que após dois anos, conseguiu prender o suspeito de ter matado o líder indígena e professor Ari Uru-Eu-Wau.
De acordo com informações da Polícia Federal, Ari morreu com marcas de espancamento, no pescoço e na cabeça, no dia 18 de abril de 2020. A PF não revelou nome do autor do assassinato. Mas, segundo a polícia o suspeito é envolvido em diversos crimes na região de Jaru, a 292 quilômetros de distância de Porto Velho (RO).
O homem acusado do assassinato do índio, no momento que foi descoberto pela PF, já cumpria prisão preventiva pela prática de outro homicídio, que aconteceu em 2021, oito meses após a morte de Ari. A polícia disse que o acusado estava preso no presídio de Jaru, onde foi cumprido o novo mandado de prisão.
O corpo de Ari Uru-Eu-Wau-Wau, de 33 anos, foi encontrado na margem esquerda da rodovia estadual RO 010, Km 12, no distrito de Tarilândia.
Sobre o crime, a organização não governamental WWF, que atua na proteção da natureza disse que é preciso esclarecer detalhes sobre a morte de Ari.
"Que a Polícia Federal possa esclarecer pontos cruciais para responsabilizar e punir os envolvidos, tais como a motivação do crime, a participação de outras pessoas e a existência de um eventual mandante".
"A destruição da floresta e o genocídio dos povos indígenas são os dois lados de uma mesma moeda: a da ausência do Estado e do controle da Amazônia pelo crime. Investigar, responsabilizar e punir assassinos é o primeiro - e importante - passo para reverter essa equação perversa".
E que é preciso "avançar, reconhecendo o valor da floresta em pé e o valiosíssimo trabalho dos povos originários na sua preservação. Todo o Brasil depende da Amazônia para a água que bebemos, que gera nossa energia elétrica e garante a abundância de alimentos", diz a organização.
Ari é um dos três índios da mesma tribo que foram mortos. (Gabriel Uchida/2019)
Para a TV Rondônia, emissora afiliada da Rede Globo, o procurador do MPF de Rondônia, falou que o poder público é responsável pelos ataques contra os territórios e as populações indígenas.
"Uma coisa é o processo penal quando as pessoas cometeram isso (assassinato). Outra coisa completamente diferente, são esses problemas que envolvem as comunidades indígenas. Isso sim, é uma coisa assim, terrível mesmo de resolver. Muito difícil, muito complicada. E que eu queria achar uma palavra mais suave. Mas eu não acho outra que não seja falta de vergonha na cara. E vergonha na cara da Funai, do Ibama, da Polícia Federal e também do Ministério Público Federal. Nos temos aí nossa parcela de culpa nesse processo todo", declarou Reginaldo Pereira.
OUTROS CRIMES E MEDO
Organizações ambientais e ativistas que atuam na defesa da natureza já condenaram o desmonte das políticas de proteção do meio ambiente feitas pelo presidente Jair Bolsonaro e no caso de Rondônia pelo governador, Marcos Rocha e os deputados estaduais, ambos integrantes da extrema direita.
Ivaneide Bandeira Cardozo, coordenadora da organização socioambiental Kanindé que atua em Rondônia, diz que é preciso que seja investigado e elucidados outros crimes contra indígenas no estado.
Bandeira comenta que além de Ari, outros dois integrantes do povos indígenas Uru-Eu-Wau-Wau foram mortos nos últimos anos.
"A gente espera muito que os outros dois casos (de mortes), sejam investigados, que cheguem aos assassinos", comenta Ivaneide.
"Vivemos muito preocupados com a ameaça de morte aos ativistas, aos indígenas. Nossas vidas estão em perigo", alerta a ambientalista.
No início deste mês, indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian, foram mortos na região do Vale do Javari, no Amazonas. O caso continua em investigação pela Polícia Federal.
TERRA INDÍGENA URU-EU-WAU-WAU
A Terra Uru-Eu-Wau-Wau é a mais importante reserva indígena de Rondônia, devido ao corredor etnoambiental, à sua biodiversidade e abundância em água doce. Com 17 nascentes de rios, ajuda a garantir o abastecimento hídrico de 12 municípios.
O povo Uru-Eu-Wau-Wau estabeleceu contato com a sociedade não indígena, a partir dos anos 1970, ao custo de sangue.
As diversas invasões e perseguições sofridas pela etnia reduziu sua população para apenas 115 indivíduos até 2010, segundo dados do Instituto Socioambiental (ISA).
Hoje, passados mais de 20 anos, não chegam a 200 pessoas. Eles dividem o território com outras oito etnias, incluindo, povos isolados e, mesmo assim, totalizam cerca de 600 habitantes. (Por Francisco Costa - @FCostaReal)