Instituto Vladimir Herzog critica Toffoli por ser contra punição a crimes da ditadura

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FRANCISCO COSTA
17 novembro 2022
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Toffoli criticou posição da Argentina de punir ditadores e agentes públicos envolvidos em violações aos direitos humanos (Foto de Nelson Júnior-STF)

Instituto Vladimir Herzog divulgou nota nesta quinta-feira (17) em que critica declarações dadas pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, em conferência em Nova York na última terça-feira (15).

No evento organizado pelo ex-governador João Doria, Toffoli classificou como “vingança” o processo argentino de responsabilização criminal de agentes públicos envolvidos em casos de tortura e desaparecimento político durante a ditadura no país vizinho. Segundo ele, o mesmo procedimento não deve ser reproduzido no Brasil.

O instituto, que leva o nome do jornalista brasileiro assassinado no DOI-CODI em São Paulo na década de 70, considera equivocada e preocupante a manifestação de Toffoli principalmente por ele ser o relator de uma ação (APDF 320) que questiona no STF a validade da Lei de Anistia.

“Causa estranheza a manifestação que parece antecipar o posicionamento do ministro em ação que há anos aguarda relatoria e no momento em que a sociedade brasileira se prepara para reconstruir a democracia, processo no qual o STF tem desempenhado papel relevante, de garantidor de direitos constitucionais”, diz trecho do comunicado.

A entidade observa que a responsabilização de agentes públicos envolvidos em crimes do passado e do presente exige firmeza e observância estrita aos princípios do direito penal, em observância aos compromissos internacionais de direitos humanos assumidos pelo Estado brasileiro e pela Constituição de 1988. E também cobra avança do Judiciário no julgamento de militares envolvidos em crimes de tortura.

“O instituto manifesta respeito pelo povo argentino e pelo processo de transição democrática que possibilitou a condenação de torturadores e assassinos, civis e militares, da ditadura militar encerrada em 1983, e estabeleceu políticas de memória e verdade que tem servido de exemplo para todo o mundo”, afirma a nota.

Na conferência, Toffoli defendeu que o Brasil esqueça as atrocidades cometidas durante a ditadura militar. “Não podemos nos deixar levar pelo que aconteceu na Argentina: uma sociedade que ficou presa no passado, na vingança, no ódio e olhando para trás, para o retrovisor, sem conseguir se superar”, disse. “O Brasil é muito maior do que isso, o Brasil é muito mais forte do que isso e nós não vamos cair nessa situação que infelizmente alguns vizinhos nosso caíram.”

Quando presidia o STF, em 2018, Toffoli foi criticado por afirmar que preferia o termo “movimento” em vez de “golpe” ou “revolução” para se referir à ditadura no Brasil. Na ocasião ele também foi questionado por nomear o general Fernando Azevedo como seu assessor especial na presidência da Corte. Azevedo deixou o cargo para virar ministro da Defesa de Jair Bolsonaro. No lugar dele, Toffoli escolheu o general da reserva Ajax Porto Pinheiro para a função.

Veja a nota do Instituto Vladimir Herzog:

“Nota do Instituto Vladimir Herzog acerca do posicionamento de Toffoli sobre responsabilização criminal

O Instituto Vladimir Herzog vem a público expressar consternação acerca da declaração feita pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), na última terça-feira, 15 de novembro, durante conferência em Nova Iorque, Estados Unidos.

Ao participar de evento ao lado de outros integrantes do STF, políticos, autoridades e empresários, o ministro classificou como “vingança” o processo argentino de responsabilização criminal de agentes públicos envolvidos em graves violações de direitos humanos ocorridas durante a última ditadura militar no país vizinho. De acordo com o ministro do STF, o mesmo não deveria ser feito no Brasil.

Para além de equivocada, a postura de Toffoli é especialmente preocupante por ser ele o relator da ADPF 320, que questiona, no STF, a validade da Lei da Anistia, promulgada em 1979. O Instituto Vladimir Herzog participa da ação na condição de amicus curiae (Para mais detalhes ver relatório do Núcleo Monitora CNV).

Causa estranheza a manifestação que parece antecipar o posicionamento do ministro em ação que há anos aguarda relatoria e no momento em que a sociedade brasileira se prepara para reconstruir a democracia, processo no qual o STF tem desempenhado papel relevante, de garantidor de direitos constitucionais.

Para nós, do Instituto Vladimir Herzog, a responsabilização de agentes públicos envolvidos em crimes do passado — e do presente — exige firmeza e observância estrita aos princípios do direito penal. Precisa atentar ao devido processo legal, nos termos que só o estado democrático de direito é capaz de assegurar, e à jurisprudência internacional e regional, fundamentada nos compromissos internacionais de Direitos Humanos assumidos pelo Estado brasileiro e pela Constituição de 1988.

Manifestamos nosso respeito pelo povo argentino e pelo processo de transição democrática que possibilitou a condenação de torturadores e assassinos, civis e militares, da ditadura militar encerrada em 1983, e estabeleceu políticas de memória e verdade que tem servido de exemplo para todo o mundo.

É dever, não apenas da sociedade brasileira, mas sobretudo de suas instituições, enfrentar o legado de graves violações de direitos humanos ocorridas no país entre 1964 e 1985, o que inclui responsabilizar os autores de graves violações de direitos humanos e de crimes contra a humanidade. O caminho segue longo. Já passou da hora desse importante passo ser dado. Cabe ao Judiciário avançar.”

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