Polícia Federal atuando no Vale do Javari, Amazonas (Foto: Joao LAET / AFP) |
Com suas terras encravadas na fronteira das Amazônias brasileira e peruana, o povo Ashaninka vive sob constante ameaça. Até a primeira metade da década dos anos 2000, madeireiros peruanos invadiam a Terra Indígena (TI) Kampa do Rio Amônia, no município de Marechal Thaumaturgo (AC). Após intensa mobilização feita pelos indígenas, as autoridades brasileiras coibiram o roubo de madeira. Mas um outro problema também antigo – o narcotráfico na Amazônia -, não só se manteve, como foi ampliado.
“Em nossa comunidade, temos tido o papel de não permitir que isso se instale dentro de nosso território. Sabemos que corremos certo risco. Já fomos ameaçados várias vezes por ter essa postura. O que estamos vendo hoje nos assusta muito. Parece que está tudo liberado para matar, para dominar. Cada um resolve as coisas como quiser. É muito ruim essa sensação que a gente vive aqui”, conta Francisco Piyãko.
Uma das principais vozes do povo Ashaninka, Francisco Piyãko afirma que o trabalho de proteção territorial e de resistência às pressões do tráfico resulta em ameaças às lideranças. Os Ashaninka já chegaram a ser assediados por narcotraficantes para autorizar a construção de uma pista de pouso dentro de seu território, o que facilitaria a entrada no Brasil da cocaína peruana.
De acordo com Francisco Piyãko, a dinâmica do tráfico nas regiões de fronteira mudou nos últimos anos. Se antes o transporte da droga era feito por “mulas forasteiras”, que não eram conhecidas, hoje ele é feito pelos próprios moradores das comunidades. “Há pessoas envolvidas a ponto de não se sentir como uma mula, mas parte desse sistema. E nós ficamos cada vez mais vulneráveis porque o Estado não melhora a sua presença”, diz a liderança Ashaninka.
Para fazer o transporte da carga ilícita aos diferentes entrepostos amazônicos – até chegar aos grandes centros distribuidores e consumidores, em viagens que duram dias ou semanas, as “mulas” precisam parar para se alimentar e dormir.
As comunidades ribeirinhas acabam sendo usadas como pontos de “reabastecimento” para comer e descansar. Diante da ação intimidadora dos traficantes, as famílias se veem obrigadas a colaborar. Outros moradores são cooptados para atuar como “olheiros”, avisando sobre a presença de polícia, sendo recompensados financeiramente pelo trabalho.
Se antes a abordagem de cooptação dos nativos acontecia de forma mais sutil, hoje o “recrutamento” ocorre de forma intimidadora. Isso porque o crime se infiltrou em diferentes frentes.