Localizada em uma área estratégica, próxima à fronteira com o Peru e com a Bolívia, a preservação da Resex é fundamental na luta pela Amazônia
|
Queimada na Resex Chico Mendes (© Ramon Aquim/WWF)
|
Criada
há 32 anos como símbolo de luta pela Amazônia e pelos povos da
floresta, a Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, área de
9.705,7 km² distribuída por sete municípios acreanos, segue
pressionada. De acordo com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais), a Resex foi a Unidade de Conservação (UC) brasileira
que mais sofreu em novembro de 2022, com 12,58 km² de vegetação
nativa desmatados. Se considerado o período de 01/01/2019 a
30/11/2022, o acumulado é de 174,04 km², o equivalente a 17.400
campos de futebol. Outros crimes ambientais, como invasões, grilagem
de terras e caça ilegal também são cada vez mais corriqueiros no
Acre, Estado onde a taxa de perda de floresta dobrou desde 2018.
As
ameaças à região têm sido intensas e constantes, especialmente
desde 2019, quando o fluxo de invasores na Resex aumentou estimulado
pela criação do projeto de lei 6024/2019, de autoria da deputada
federal Mara Rocha (MDB), que não só propõe reduzir em 222 km2 a
área da reserva extrativista como também permitir a regularização
das terras de grileiros e invasores. Desde o final de 2021, o PL
aguarda a realização de audiências públicas e parecer do relator
nas comissões internas da Câmara de Deputados.
Além
do ataque no Legislativo, o desmonte do ICMBio (Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade), órgão responsável pela
fiscalização e gestão da Resex, promovido durante o governo
Bolsonaro, ajudou a intensificar os crimes ambientais na região.
Localizada em uma área estratégica, próxima à fronteira com o
Peru e com a Bolívia, a preservação da Resex é fundamental na
luta pela Amazônia, pois, assim como terras indígenas, reservas
extrativistas e outras UCs funcionam como verdadeiras barreiras
contra a devastação.
Semana Chico Mendes
É
nesse contexto que começa hoje, em Xapuri, a 33ª Semana Chico
Mendes, que ocorre tradicionalmente entre os dias 15 e 22 de dezembro
– datas de nascimento e morte, respectivamente, do líder
seringueiro – e que conta pelo com o apoio do WWF-Brasil desde a
edição de 2018. Com o tema “Amazônia e Emergência Climática:
Reflorestando o pensamento a partir das vozes da Floresta”, o
evento busca discutir a importância das novas gerações e novas
formas de defender e conservar a floresta.
Confira
a programação aqui e acompanhe os
desdobramentos pelas redes sociais do Comitê Chico Mendes.
Manter
a Amazônia de pé foi o projeto de vida de Chico Mendes. Nascido no
seringal Porto Rico, em Xapuri, desde jovem ele entendeu a
necessidade de se construir uma relação de troca sustentável e
respeitosa com a natureza. Dos empates, tática em que os
seringueiros se colocavam como escudos humanos na frente dos tratores
de invasores, à criação das reservas extrativistas, Chico Mendes
foi um dos maiores defensores da floresta.
Para
que esse legado seja mantido, nos últimos anos o Comitê Chico
Mendes vem focando seu trabalho principalmente no projeto Jovens
Protagonistas, para formação de novas lideranças. O objetivo é
fortalecer a organização social, o vínculo dos participantes com o
território e assegurar que o modo de vida dos povos da floresta seja
respeitado, oferecendo uma formação cidadã, crítica e reflexiva
para novas lideranças de UCs acreanas.
Uma delas é
Laiane Santos, que em novembro esteve na 27a Conferência das
Partes sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP27), em Sharm El-
Sheik, no Egito, com integrantes do Comitê Chico Mendes e pôde
compartilhar suas experiências na iniciativa e também no Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Brasiléia, do qual faz
parte.
Resposta à crise climática
Essa
foi a primeira vez que membros do Comitê Chico Mendes e sua
presidenta, Angela Mendes, estiveram em uma COP. E o momento não
poderia ter sido mais oportuno. Ao longo de dias intensos de
negociação e debates, mais uma vez, ficou evidente que a maior
contribuição que o Brasil pode dar à ação climática global é
justamente combater o desmatamento.
Em
uma nota técnica inédita, que foi entregue aos
negociadores da ONU durante a COP27, o WWF-Brasil advertiu que a meta
de 1.5ºC do Acordo de Paris não será cumprida sem a participação
dos produtores agropecuários. O trabalho mostrou que a cadeia de
produção de alimentos contribui com, pelo menos, um terço do total
de emissões líquidas dos gases de efeito estufa que estão mudando
o clima do planeta.
Outro destaque durante o
evento no Egito foi o reconhecimento da importância das soluções
que vêm dos territórios e que devem beneficiar as próprias
comunidades, pois elas estão na linha de frente da proteção da
floresta, que além de garantir a segurança climática global,
também é responsável por diversos serviços
ecossistêmicos.
Solução para um futuro com
natureza-positiva
Apesar de cobrir apenas
cerca de 1% da superfície do planeta, a Amazônia abriga 10% de
todas as espécies de vida selvagem que conhecemos – e
provavelmente muitas que ainda não conhecemos. E as soluções para
garantir sua proteção e evitar que ela chegue ao ponto de não
retorno, quando o bioma não conseguirá mais se recuperar
naturalmente, precisam contemplar a sabedoria dos povos da floresta,
como destacou Angela durante a COP27.
“As
reservas extrativistas foram modelo para outras unidades de
conservação com pessoas dentro e hoje protegem uma quantidade muito
grande de floresta e de pessoas, que assim como os povos indígenas
têm o papel fundamental de guardiões desse território, guardiões
da biodiversidade e guardiões dessa identidade e cultura”,
disse.
Preservar a floresta e os povos da floresta
também é o foco da
Conferência
da Biodiversidade da ONU (COP15), que acontece desde
a semana passada em Montreal, no Canadá, pois o que está em jogo é
o futuro da vida em todas as suas formas, inclusive a humana.
A
expectativa do WWF-Brasil e de diversos países e organizações
presentes no evento é que sejam estabelecidos acordos que reduzam a
perda de biodiversidade até 2030 para que possamos garantir
natureza-positiva já em 2050: ou seja, que o saldo entre o que
consumimos e o que a natureza é capaz de regenerar seja positivo.