Terra de sangue: conflitos agrários recomeçam em Rondônia com tiros e morte

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FRANCISCO COSTA
7 janeiro 2023
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Policiais militares na desocupação de terra em Nova Mutum em 2021. (Foto PM Sérgio)

A disputa pela posse de terra recomeçou de forma violenta com o início do ano de 2023. Em uma das áreas de maior conflito agrário de Rondônia houve trocas de tiros e uma pessoa foi encontrada morta. A região de tensão fica na zona rural de Porto Velho, no distrito de Nova Mutum Paraná, na abrangência do território da fazenda NorBrasil de propriedade de Antônio Martins dos Santos, conhecido como "Galo Velho". É uma localização aproximada onde fica também o acampamento Tiago dos Santos, em Nova Mutum (RO), lar de mais de duas mil famílias da Liga dos Camponeses Pobres (LCP), organização sem-terra que atua no estado.

De acordo com informações dos policiais e de jornais, ao menos vinte homens tentaram ocupar uma área da fazenda na quarta-feira (04-01-23). A fazenda recebe proteção de policiais militares contratados para fazer a segurança armada, quando eles não estão de plantão nos quartéis ou já se aposentaram. Operários estavam trabalhando na reforma de uma casa na fazenda, quando teria começado a troca de tiros dos militares com invasores.

Um sargento da polícia, 55 anos de idade, ficou ferido na perna. Outro três teriam se refugiado na floresta, mas não sofreram ferimentos. O sargento recebeu um tiro de raspão na perna direita, conseguiu ajuda de trabalhadores em uma camionete e foi socorrido para a Unidade de Pronto Atendimento do distrito de Jaci-Paraná e depois transferido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência ao Hospital João Paulo II. Um dos carros usados pelos PMs ficou crivado de balas.


Policial militar aposentado baleado na perna (Divulgação)

Na manhã do dia seguinte, o Batalhão de Choque da PM se deslocou para o local do conflito. Na linha Linha 25, região entre o distrito de Nova Mutum Paraná, na capital e Nova Dimensão, em Nova Mamoré, foi encontrado numa estrada de chão o corpo de um homem com marcas de bala, que seria de fuzil. A vítima não tinha documentos pessoais, quando foi localizado. Mas a polícia identificou como sendo Patrick Gasparini Cardoso, 26, vulgo “Cacheado”, que seria integrante da LCP, segundo policiais, informação não confirmada pela Liga.

O governo de Rondônia publicou uma nota para a imprensa onde diz que o caso será investigado. "Equipes das Polícias Militar, Civil e Técnico-Científica se deslocaram na manhã desta quinta-feira, 5, para levantarem informações periciais necessárias ao esclarecimento das investigações que estão sendo realizadas pela Polícia Civil. A Sesdec ressalta que todas as providências estão sendo tomadas para esclarecer o ocorrido, para identificar as pessoas envolvidas nos ataques, e que diversas ações policiais têm sido realizadas objetivando manter a tranquilidade pública na Ponta do Abunã".

De acordo com os policiais, os primeiros tiros foram disparados pela Liga do Camponeses Pobres (LCP), mas nossa reportagem não conseguiu ouvir os camponeses. A Liga foi fundada em 1999, é o principal movimento social de Rondônia em defesa da reforma agrária – ou “revolução agrária”, como os integrantes costumam dizer. Os trabalhadores rurais que compõem a LCP pregam a “morte do latifúndio” e seguem princípios do comunista Mao Tsé-Tung, que liderou a Revolução Chinesa em 1949.

Durante entrevista para TV Rondônia (Rede Amazônica), o governador reeleito, Marcos Rocha (UB), criminalizou os movimentos sociais, mesma tática usada pelos ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PL), para desacreditar defensores da reforma agrária. “A gente tem que combater uma organização criminosa que existe por parte dessas ações. Não é um movimento social, são criminosos que existem e que muitas vezes utilizam a fachada de movimento social”.

Rocha defende apenas a regularização fundiária como medida para paz no campo. “Com regularização fundiária, a gente encerrada o problema de queimada ilegal, porque todos terão o documento. A gente consegue acabar com o conflito agrário e com essas mortes”.

Segundo informações da Comissão Pastoral da Terra, até o primeiro semestre de 2022, cerca de 15 pessoas foram mortas em conflitos agrários em Rondônia.

HISTÓRICO - Em 2021, outras mortes aconteceram na mesma região. O tenente da reserva José Figueiredo Sobrinho e o sargento Márcio Rodrigues da Silva estavam pescando quando foram abordados e mortos.

Naquele ano o Supremo Tribunal Federal (STF), proibiu a reintegração de posse pelo o governo de Rondônia que usou estrutura da Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania (Sesdec), com reforço e apoio da Força Nacional.

Em 17 de novembro de 2022, uma operação da Polícia Federal (PF) desarticulou uma milícia rural composta por policiais civis e militares, envolvida em grande parte dos assassinatos de lideranças sem-terra em Rondônia.

Foram cumpridos 32 mandados de prisão, cinco de busca e apreensão e um de afastamento de função pública. Os nomes dos detidos não foram divulgados pela PF. A operação da PF deflagrada neste mês confirma as denúncias feitas por movimentos populares do campo, que preveem um período de relativa diminuição da violência, pelo menos até a milícia se organizar novamente.

Segundo informações divulgadas com base em inquérito da PF, "Galo Velho" seria líder de um esquema de invasão e grilagem de terras públicas, com uso frequente da pistolagem que movimenta milhões de reais.

"Galo Velho" já foi preso sob essas suspeitas em 2020, mas hoje vive uma vida confortável em Brasília. Com os sigilos bancários quebrados, os investigadores descobriram que a milícia movimentou R$ 450 milhões.

O valor é quase 30 vezes maior do que o orçamento da Polícia Militar (PM) de Rondônia para 2022. A quantia espantou até mesmo quem acompanha de perto as ações violentas da milícia.

A defesa de Antônio Martins dos Santos, conhecido como "Galo Velho" não foi localizada, como também, integrantes da LCP, mas podem entrar em contato pelo e-mail: fscneto@gmail.com

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