FOTO: MARCOS SANTOS / USP IMAGENS |
Por Islandia Bezerra - Ao falarmos de políticas públicas alimentares é preciso concebermos um foco. E este foco é a agroecologia
“Não há como dimensionar o valor da vida, se não dimensionarmos o valor da própria existência. A vida que pulsa e impulsiona processos sociais, culturais e identitários, biológicos e fisiológicos, alinhados com a natureza, passa pelo ato de se alimentar (e alimentar os/as demais)” 1. Com essa citação, inicio esta reflexão acerca dos sistemas alimentares sustentáveis e saudáveis e de como estes sinalizam e concretizam a saída do quadro desolador de fome, miséria, destruição ambiental que assola o nosso país.
Para termos a garantia do bom comer alimentos e/ou preparações e outras conexões são imperativas. Nutrir corpo, mente e espírito depende de fatores de como produzir e/ou adquirir, preparar, comer e, por fim, aproveitar biológica e fisiologicamente seus nutrientes. Sem negligenciar outras dimensões como as simbólicas, culturais, ou aquelas que atendam também os aspectos da espiritualidade e/ou do prazer do comer.
A complexidade dos sistemas alimentares e – me refiro a “alimentares” já que ao usar o termo “agroalimentares” localiza o debate no campo da agricultura -, passa por compreender o papel das políticas públicas nessa conformação. Nesses termos, Elisabetta Recine, Ana María Suárez Franco e Colin Gonsalves (2021) 2 trazem para o bojo das análises a concepção de “processos alimentares” 3. Os processos alimentares são flexíveis, diversos, multidimensionais e “circular na sua aparência e espiral em sua evolução”.
Esta concepção nos faz convergir para a agroecologia. Essa ciência que com sua dinamicidade dialoga com movimentos sociais do campo (e da própria natureza) e, na prática considera as distintas formas de construir conhecimentos científicos e populares e nos localiza no campo das políticas públicas de forma mais propositiva.
Ao falarmos de políticas públicas alimentares é preciso concebermos um foco. E este foco é a agroecologia. Portanto, as políticas públicas alimentares e agroecológicas têm, por essência, a capacidade de desafiar as estruturas de poder – capitalista, classista, patriarcal, machista e racista – que nos amarram. Estas devem considerar, portanto, processos que orientem e promovam novas relações da sociedade-natureza, dela com ela mesma e dela com a natureza.
Precisamos garantir a institucionalidade necessária, sobretudo de democracia e respeito ao Estado de direitos, para pôr em prática as transições-transformações que precisamos para avançar enquanto um país plural, diverso, alimentado e nutrido.
Sobre a autora
Islandia Bezerra é potiguara. Mulher. Mãe. Professora associada, extensionista e pesquisadora da Faculdade de Nutrição/FANUT da Universidade Federal de Alagoas/UFAL. Educadora colaboradora na ELAA (Escola Latino-Americana de Agroecologia). Nutricionista com mestrado e doutorado em ciências sociais/UFRN. Pós-doutorado na Universidad Autónoma de Chapingo/UACh, México. Presidenta da Associação Brasileira de Agroecologia/aba-agroecologia
Sobre o texto
Esse ensaio faz parte de um conjunto de artigos publicados, conjuntamente, pela Bori e Nexo Políticas Públicas no âmbito da série “Coletiva Bori & Nexo Políticas Públicas sobre sistemas alimentares”. Para reproduzi-lo em veículos de comunicação, é preciso informar que o texto foi originalmente publicado no Nexo Políticas Públicas e Bori.