Comoção após o desaparecimento de Bruno Pereira e Dom Phillips impulsionou debate sobre problemas em órgãos de proteção - Kenzo Tribouillard/ AFP |
O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) pediram que a Justiça condene o governo federal a pagar R$ 50 milhões em danos morais coletivos pelo desmonte da Fundação Nacional do Índio (Funai) sob o governo de Jair Bolsonaro (PL).
A indenização deverá ser repassada à Funai e a entidades indigenistas para garantir a integridade de povos indígenas e de recente contato, principalmente na Terra Indígena (TI) Vale do Javari, onde o jornalista Dom Phillips e o indigenista Bruno Pereira foram assassinados há um mês.
Os órgãos apontam que as mortes ocorreram em função da "omissão estrutural" do poder público. As solicitações, protocoladas hoje (4), preveem que Funai seja obrigada a instalar bases de proteção no Amazonas.
Se o pedido for julgado procedente, a Funai terá 30 dias para apresentar cronograma de instalação, a ser formulado com base em consulta aos indígenas, e será obrigada a financiar integralmente as medidas, sem contingenciamento de recursos.
Áreas críticas haviam sido mapeadas por Bruno Pereira
O planejamento deverá trazer planos de reestruturação das Frentes de Proteção Etnoambiental da Funai em todo o Amazonas. O pedido prioriza dois pontos considerados críticos na TI Vale do Javari: a reinstalação da base no rio Jandiatuba e a inauguração de um posto de proteção no rio Curuena.
Nesses locais, a Equipe de Vigilância da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), integrada por Bruno Pereira, havia mapeado a invasão de garimpeiros, caçadores e pescadores. O mapeamento ocorreu semanas antes do assassinato do indigenista e do jornalista.
Em outro pedido feito neste domingo (3), a DPU requer o envio imediato de forças de segurança para o Vale do Javari, segunda maior Terra Indígena (TI) no Brasil e lar da maior concentração de povos isolados do planeta.
A DPU afirma que a presença do efetivo foi imposta pela Justiça há 20 dias, mas até agora não houve qualquer medida nesse sentido.
Bruno e Dom "deram a vida" por indígenas, dizem MPF e DPU
Os pedidos foram feitos no âmbito de uma ação judicial iniciada há quatro anos, que já pedia a destinação de recursos humanos e materiais às bases da Funai voltadas à proteção dos povos isolados e de recente contato.
Na petição mais recente, ao qual o Brasil de Fato teve acesso, os órgãos apontam a "notória desestruturação" das instalações e o risco de populações indígenas "extremamente vulneráveis".
"Bases precárias, desestruturadas, sem recursos humanos, materiais, técnicos e orçamentários, estavam esquecidas no meio da floresta no ano de 2018. A União, por sua vez, falhou ao não conferir recursos orçamentários que permitiriam o cumprimento da função constitucional conferida ao órgão indigenista", diz trecho do pedido.
O documento é assinado por dois defensores públicos da União, Francisco de Assis Nascimento Nóbrega e Renan Vinicius Sotto Mayor, e pelo Procurador da República no Amazonas Fernando Merloto Soave. A Univaja foi incluída como parte interessada no processo.
"Os graves e tristes acontecimentos dos últimos dias, em que ocorreu o assassinato de dois grandes defensores de direitos humanos, é reflexo direto do aprofundamento da omissão estrutural do Estado em relação aos povos indígenas isolados", escrevem os signatários da petição.
"Eles [Bruno e Dom] deram a vida para registrar e enfrentar as ameaças que os territórios indígenas e seus povos sofriam. Lutaram por essa causa e por ela morreram. Tentaram agir na omissão do poder público e naquilo que o poder público falhou e segue a falhar", prossegue o texto.