No mesmo ano, o Senado aprovou o novo Marco Legal do Saneamento Básico (PL 14.026/2020), que instituiu metas de universalização do setor até 2033, com 90% das casas atendidas com água potável e esgoto tratado. Após muitas especulações, na última quarta-feira (05), o presidente Luiz Inácio da Silva alterou dois textos que modificam premissas contidas na Lei Federal que institui o marco.
Uma das novidades é a permissão de que as empresas estaduais da área continuem operando os serviços de água e esgoto sem licitação. Até agora, boa parte desses contratos era considerada irregular, porque muitas dessas companhias não conseguiram comprovar capacidade econômico-financeira, exigida pela lei, para cumprir as metas de universalização previstas no marco.
Para Fernando Silva, sócio-fundador da PWTech, startup de sistemas de filtragem, referência na ajuda humanitária de países emergentes, como Haiti, Tonga e Madagascar, a decisão requer atenção e já aumenta a insegurança de empresários do setor, travando alguns investimentos que poderiam melhorar a qualidade de vida da população.
“Hoje, para que o país atinja a meta estipulada no Marco Legal de Saneamento Básico, a média de investimento em saneamento anual deve passar para R$ 200 por habitante. Com a falta de políticas bem desenvolvidas, o Brasil convive com o retrocesso humano e social, ampliando desigualdades já existentes”, diz Silva.
Ao todo, o país gastou em torno de R$ 70 milhões de reais com internações por doenças associadas à falta de saneamento básico. Dentre os números de internações, crianças e adolescentes, entre 5 e 19 anos, foram os mais afetados - aproximadamente, 35 mil foram hospitalizados no ano estudado. Os principais diagnósticos são: amebíase, giardíase, gastroenterite, febre tifóide e paratifóide, hepatite infecciosa (Hepatite A e E) e cólera.
A desigualdade sanitária e social foi um dos destaques do Ranking do Saneamento 2023, realizado pelo Instituto Trata Brasil, em conjunto com a GO Associados. O documento analisa os indicadores de saneamento das 100 maiores cidades do país, que concentram 40% da população brasileira. Veja alguns destaques:
Acesso à água potável: Enquanto 99,7% da população das 20 melhores cidades têm acesso às redes de água potável, nos 20 piores municípios, o número é de 79,6% da população.
Acesso a coleta de esgoto: 97,7% da população nos 20 melhores municípios têm acesso aos serviços, enquanto somente 29,2% da população nos 20 piores municípios são atendidos.
Tratamento de esgoto: Enquanto o primeiro grupo tem, em média, 80,1% de cobertura de tratamento de esgoto, o grupo dos piores trata apenas 18,2% do esgoto produzido.
O especialista reforça que é necessário discutir modelos de gestão de saneamento que consigam ir onde a rede de distribuição não vai. “Em locais afastados, que vivenciam diferentes realidades no âmbito urbano e rural, a universalização não ocorre uniformemente. É nítido a concentração de déficits referentes a serviços de água e esgotos”, complementa.