Cacique Adriano Karipuna (Foto: @ Alexandre Noronha - Amazônia Real) |
Os indígenas querem ações permanentes do governo federal dentro do território. O povo Karipuna resiste aos grileiros que estão invadindo a terra.
Voz da Terra
Desde o início de junho o governo brasileiro realiza uma operação com mais de 200 servidores públicos de 20 órgãos federais na Terra Indígena Karipuna, em Rondônia. A desintrusão tem o objetivo de proteger e garantir os direitos da etnia, uma das menores do pais e a mais ameaçada pelos criminosos ambientais.
Garimpeiros, madeireiros ilegais vão ser retirados das terras dos indígenas para preservar a organização social, costumes, língua, crenças e tradições dessa etnia, que enfrenta risco de extermínio.
No período de 30 dias, crimes ambientais serão combatidos, haverá ações para erradicar o trabalho análogo à escravidão e promover a sustentabilidade ambiental. O governo diz que para garantir a eficiência da operação, está sendo utilizado um robusto aparato tecnológico, incluindo aplicativos de navegação georreferenciada, drones, antenas e um painel de monitoramento. Essa infraestrutura assegura precisão nas ações realizadas.
No momento, a operação de desintrusão trouxe uma sensação de confiança, mas os indígenas querem a presença permanente do governo federal dentro do território com estrutura de segurança, proteção e garantias de políticas públicas sociais, ambientais e sustentáveis.
"O trabalho está saindo bem. Agora no momento nos sentimos mais seguros. Mas queremos que tenha uma base permanente, para realizar mais operações de proteção no território Karipuna. Provavelmente (os invasores) vão retornar" disse André Karipuna, Cacique do povo ao Voz da Terra.
Na semana passada, cinco trabalhadores em condições análogas à escravidão foram resgatados de fazendas dos invasores. As duas propriedades de criação de gado bovino de corte, onde ocorreu a fiscalização, ficam localizadas na região de Minas Novas, próximas ao distrito de Rio Pardo, em Porto Velho (RO), na Reserva Extrativista (Resex) estadual de Jaci Paraná, adjacente à TI Karipuna.
Um vaqueiro foi resgatado em uma das propriedades e, na outra, quatro trabalhadores, incluindo um adolescente de 16 anos. Todos os trabalhadores tinham sido contratados para roçar a pastagem e viviam em condições degradantes, alojados em locais precários, sem acesso à água potável e instalações sanitárias, além de trabalharem sem registro em carteira. Ao mesmo tempo, várias operações da Polícia Federal e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) estão ocorrendo no entorno do território dos Karipunas.
Após a retirada dos invasores, medidas deverão ser implementadas para impedir o retorno dos agressores ambientais à terra dos indígenas. "A gente sofre grandes ameaças. Essa (desintrusão) pode aumentar as ameaças depois e vemos isso com preocupação. Nos sentimos seguros, mas pensamos mais na frente por que podemos sofrer grande risco de novas ameaças", diz o Cacique.
Base das Forças de Segurança na TI Karipuna (Divulgação - Exército) |
No inicio deste ano lideranças do povo Karipuna tiveram um encontro em Porto Velho, com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin. Eles entregaram uma carta com reinvindicações do povo.
VEJA O TEOR DO DOCUMENTO:
"Porto Velho, 23 de fevereiro de 2024
Ministro Edson Fachin
Supremo Tribunal Federal
Prezado Senhor,
O Território Karipuna, situado entre o município de Nova-Mamoré e de Porto Velho, no estado de Rondônia, terra demarcada, homologada e registrada, sofre desde 2015, quando se produziram as primeiras denúncias das intensas invasões, expressa na política de extermínio histórico contra o povo Karipuna. Somos afetados e impactados de todas as formas, por grandes empreendimentos, pelo avanço do agronegócio, pela grilagem de terra e o roubo de nossos recursos naturais, com a extração de madeira, roubo de castanhas e de peixe.
Desde 2017 o povo denuncia a grilagem de terra, na TI Karipuna, por todo o seu quadrante, com entradas ilegais, algumas os acessos são por fazendas com porteiras fechadas. Os Karipuna e o Cimi vêm denunciando em nível local, nacional e internacional as inúmeras violências e violações de direitos que os Karipuna vem sofrendo e a destruição da terra indígena, com os desmatamentos frequentes para o plantio de pasto, que serve como meio para os invasores garantir a posse da terra.
Os dados governamentais e do INPE, divulgam as baixas no desmatamento, mas infelizmente, os órgãos governamentais não divulgam o aumento da grilagem de terra no interior das terras indígenas e a pressão pelo agronegócio, com o novo ciclo colonizatório, que é o projeto de desenvolvimento Sustentável Madeira e Abunã, que é o aumento do agronegócio e que avança ilegalmente sobre nossa terra. Os dados governamentais podem comprovar a diminuição do desmatamento na TI Karipuna, mais não é o que se vê no dia a dia no território, que os grileiros firmam sua presença na terra, através da grilagem de terra, com pastos plantados em lugares antes denunciados e o roubo de madeira em lugares já denunciados inúmeras vezes. Essa situação vem piorando com a aprovação da lei 14.701, que normatiza o marco temporal pelo Senado Federal.
Apesar das inúmeras denúncias e uma ação judicial ter transitado em julgado, citamos a ADF 709, do STF, que prevê fiscalização e retirada dos invasores, garantindo a proteção da T. I. Karipuna e outra em curso, não há uma eficácia na retirada dos invasores, ocorrendo operações que não surtem efeitos, uma vez que não existe uma Base Permanente para fazer a fiscalização da Terra Indígena, deixando em situação de extrema vulnerabilidade os Karipuna e os povos isolados, que vivem no interior da mesma.
Outro ponto denunciado diversas vezes, com provas da existência de povos isolados no norte e na parte sul da terra, até o presente momento as incursões da equipe do setor de índios isolados da Funai não criou medidas para a proteção dos isolados e retiradas dos invasores, denúncias estas apresentadas em agosto de 2021, no ano 2022 quando uma comitiva do povo se deslocou até Brasília e em diversos documentos protocolados no ano de 2022 e três documentos protocolados já em 2023.
Estamos indignados e novamente denunciamos a falta de eficácia do Estado Brasileiro, em garantir o direito constitucional, que é a proteção territorial e a proteção física dos povos isolados e nossa. Já passa mais de um ano do novo governo e até o presente momento, pouco e nada foi feito. Diante do exposto solicitamos urgente:Retirada dos invasores, com uma equipe de fiscalização e proteção territorial permanente T. I. Karipuna, por todo o entorno da terra indígena e a retirada dos invasores e a reparação dos danos ambientais.
Que se reative a base de proteção e fiscalização na T. I. Karipuna, destruída pelos invasores, como retaliação a comunidade e a contratação de pessoas da comunidade, para receber pelo trabalho de proteção e fiscalização que já fazem de forma permanente na T. I. Karipuna.
Que haja uma base de Proteção aos povos isolados e ao povo Karipuna.
Que seja liberado em caráter de urgência, o recurso da compensação pelos impactos sociais e ambientais, resultantes do Complexo do Madeira.
Que haja a desintrução da T. I. Karipuna, com a identificação de todos grileiros que estão desmatando e marcando lotes, assim como quem financia tais pessoas.
Diante do exposto, aguardamos celeridade no que diz respeito às demandas do povo Karipuna e a ação do Supremo Tribunal Federal, com relação a ADPF 709 e medidas tangíveis par coibir a inconstitucionalidade da Lei 14.701, que normatizou a ilegadade do marco temporal, tendo grande prejuízo para a integridade física, cultural e territorial do nosso povo e dos povos isolados que vivem constantemente ameaçados de um genocidio, pela presença do crime organizado que comanda as ações dentro e no entorno do território.
Atenciosamente,
Eric One Karipuna
Liderança
Adriano Karipuna
Liderança"