Quem é a deputada de Rondônia que defende o PL do aborto?

Cerca de 61,4% das vítimas de estupro no Brasil têm até 13 anos (10,4% têm menos de 4 anos) e cerca de 70% dos agressores são conhecidos das vítimas.
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Voz da Terra
20 junho 2024
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Cristiane Lopes é da bancada evangélica (Foto: Câmara dos Deputados)

O apoio da parlamentar ao Projeto de Lei representa um retrocesso na garantia dos direitos reprodutivos e de saúde das mulheres no Brasil. 

Voz da Terra 

A deputada federal Cristiane Lopes Benarrosh (UB), representante de Rondônia na Câmara Federal, tem ganhado destaque recentemente devido ao seu apoio ao Projeto de Lei 1904/24, que propõe equiparar o aborto realizado após as 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, aumentando a pena máxima para até 20 anos de prisão para quem realizar o procedimento. A iniciativa levanta questões cruciais sobre direitos reprodutivos, saúde pública e justiça social no Brasil.

Cristiane Lopes, 40, é natural de Porto Velho, casada, mãe, evangélica e é a única dos oito parlamentares da bancada federal rondoniense que continua a favor da Lei que fere os direitos de mulheres e meninas. Uma das representantes da extrema direita e defensora do Bolsonarismo, Lopes ocupou o cargo de vereadora de Porto Velho de 2016 a 2020. Em 2018, ela concorreu como candidata a deputada federal, mas foi somente em 2022 que alcançou a posição pelo partido União Brasil com 22.806 votos. Antes atuou como repórter policial e apresentadora de noticiário sobre crimes na TV, onde fez muito assistencialismo.

O apoio de Cristiane Lopes ao Projeto de Lei representa um retrocesso na garantia dos direitos reprodutivos e de saúde das mulheres no Brasil. 

A legislação brasileira atual já é restritiva em relação ao aborto, permitindo-o apenas em casos de risco à vida da gestante, gravidez resultante de estupro e anencefalia fetal. A proposta defendida pela deputada, representa um endurecimento ainda maior, ignorando contextos de saúde e de violência que frequentemente cercam decisões relacionadas à gravidez.

O PL apoiado por Cristiane, reflete uma postura conservadora que desconsidera a realidade de milhares de mulheres brasileiras que enfrentam dilemas complexos durante a gravidez.

Um Brasil de violência histórica

Dados do Ministério da Saúde indicam que o aborto inseguro é uma realidade preocupante no Brasil. Contribui para altas taxas de complicações de saúde e mortalidade materna, especialmente entre mulheres de baixa renda nas periferias e lugares mais isolados. Restrições adicionais ao aborto, como as propostas em debate, empurram mulheres para procedimentos clandestinos e perigosos, colocando suas vidas em risco.

No Brasil, a Safernet divulgou, no início deste mês, um trágico recorde: 71.867 denúncias de imagens de abuso e exploração sexual infantil on-line, em 2023. O número é 77,13% superior ao de 2022 e recorde absoluto nos últimos 18 anos de funcionamento da Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos.

A violência está em todas as classes sociais e em todos os lugares, de grandes centros a pequenas comunidades: 61,4% das vítimas de estupro no Brasil têm até 13 anos (10,4% têm menos de 4 anos) e cerca de 70% dos agressores são conhecidos das vítimas, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023.

Pesquisa do Datafolha, em parceria com o Instituto Liberta, divulgada em 2022, mostrou que um em cada três brasileiros diz ter sido vítima de agressão sexual física ou verbal na infância ou na adolescência. Um terço deles admitiu que sofreu agressões de ordem sexual quando tinha menos de 18 anos, mas apenas 11% denunciaram e 26% tiveram coragem de contar para alguém.

Entre 1º de janeiro e 13 de maio deste ano, foram feitas 7.887 denúncias de estupro de vulnerável ao serviço Disque Direitos Humanos (Disque 100). A média de denúncias nos primeiros 134 dias do ano foi de cerca de 60 casos por dia ou de dois registros por hora.

A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, lembra que “as principais vítimas de estupro no Brasil são meninas menores de 14 anos, abusadas por seus familiares, como pais, avôs e tios. São essas meninas que mais precisam do serviço do aborto legal, e as que menos têm acesso a esse direito garantido desde 1940 pela legislação brasileira".

Em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam mães a cada dia no Brasil. Em 2022, último período disponível nos relatórios do Sistema Único de Saúde (SUS), foram mais de 14 mil gestações entre meninas com idade até 14 anos.

Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado pelo FBSP, contabiliza que 56,8% das vítimas de estupro (adultos e vulneráveis) em 2022 eram pretas ou pardas; 42,3% das vítimas eram brancas; 0,5% indígenas; e 0,4% amarelas.

Em 2022, de cada quatro estupros, três foram cometidos contra pessoas “incapazes de consentir, fosse pela idade (menores de 14 anos), ou por qualquer outro motivo (deficiência, enfermidade etc.)”, informa publicação do FBSP, em 2023.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que apenas 8,5% dos estupros no Brasil são relatados à polícia. A projeção do instituto é que, de fato, ocorram 822 mil casos anuais.

Mantida a proporção de três quartos dos casos registrados nas delegacias, o Brasil teria mais de 616 mil casos de vulneráveis por ano.

Dignidade e respeito aos direitos humanos

Evidências internacionais mostram que políticas de criminalização do aborto não reduzem significativamente sua incidência, mas aumentam os danos à saúde do sexo feminino. Países que adotam políticas mais flexíveis, garantindo acesso seguro ao aborto, conseguem reduzir os impactos negativos à saúde pública e promover direitos reprodutivos fundamentais.

O debate sobre o aborto deve considerar não apenas convicções morais e religiosas, mas também princípios constitucionais de direitos individuais e de autonomia sobre o próprio corpo.

É fundamental que o debate parlamentar leve em conta evidências científicas e experiências internacionais para promover políticas públicas que realmente protejam e respeitem a dignidade e os direitos das mulheres em todas as suas decisões reprodutivas.

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